segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Histórico e existencial


Segundo livro de Marcela TagliaferriExílio (Ímã Editorial, 2012) conta a história de um personagem que esteve 15 anos num manicômio, em plena ditadura militar. Em conversa à Shahid, Marcela – que também é historiadora – fala sobre seu processo de pesquisa, suas referências (reais e literárias) e as possibilidades do livro digital.

Resumidamente, qual é a trama de Exílio?
Vicente foi trancafiado por 15 anos num manicômio, isolado da mulher e do único filho. De volta à sua casa, descobre que foi manipulado por uma rede de intrigas montada pelo sogro – empresário anticomunista atuante no governo militar e fundador do IPES (Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais, que coordenava a propaganda ideológica anticomunista) – com o objetivo de mantê-lo afastado da filha, por quem sente paixão.

De onde veio a ideia para o livro?
Eu trabalho com imagens e conheço a história de uma pessoa que ficou internada 20 anos num manicômio. A partir daí veio a ideia de escrever sobre o tema. Criei um protagonista que vivenciasse esta separação, perdesse as suas referências. Ao fazer as contas do tempo para trás, percebi que podia cair na ditadura brasileira, o que aumentaria e muito a angústia da situação vivenciada por ele. Afinal, em tempos de exceção todos nós nos tornamos exilados em diversos sentidos.

Como sua experiência como historiadora influenciou na construção desta narrativa, ambientada em plena ditadura militar?
Ela contribuiu principalmente na pesquisa para a montagem do cenário literário, a partir de fontes fidedignas. E criei um cenário de acordo com a ideologia anticomunista disseminada na época através do IPES. Pesquisei a partir do livro 1964: a conquista do Estado (Editora Vozes, 2006) de R. Dreyfuss, uma referência sobre o tema, entre outras leituras sobre tortura e manicômio. Além de ser um cenário inédito na ficção brasileira.

Quais as dificuldades de escrever sobre o tema? Você chegou a ouvir pessoas, fazer pesquisas?
Foram muitas, porque não é um tema fácil. Foi um momento muito difícil de nossa história e juntei dois aspectos: o histórico e o existencial. Contudo, justamente por não ser um romance histórico, o fundamental era trabalhar a verossimilhança. Por isso fiz pesquisas em textos históricos, conversei com pessoas, tive a ajuda do meu analista, Luiz Alfredo Millecco, na confecção de um personagem perverso, um torturador, além de ler muito sobre manicômio, ver filmes e conversar com a psiquiatra Fernanda Gueiros.

Além da versão impressa, Exílio também circula em versão digital. Quais as vantagens deste novo suporte?
A tecnologia só vem agregar à circulação de informação e conhecimento. Vivemos numa sociedade em rede, vejo como mais uma ferramenta. Facilita em muitos aspectos: você pode levar vários livros dentro de um tablet caso for viajar, ler em qualquer lugar, pelo telefone. Apesar de adorar o livro impresso, não me sinto ameaçada pelo livro digital, ao contrário, ainda mais no Brasil, onde não existe biblioteca nem livraria em todos os cantões do país. Agora, o importante é saber utilizar da melhor forma. Mas, sozinhos, nem o meio digital, nem o impresso, formam leitores – a grande questão do nosso país.

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