quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Cristal rutilado, de Vania Azamor



Há uma linha mestra em Cristal rutilado (7 Letras), novo livro de Vania Azamor. A autora se vale da espiritualidade para discorrer sobre eternidade e transcendência. Assim, ilumina o oculto, aliando metafísica a ensinamentos da filosofia oriental. Na orelha do livro, Suzana Vargas adverte o leitor: "livro pra ser degustado sem pressa, com olhos e ouvidos atentos".
Vania é funcionária pública e possui mais dois livros publicados: Olhar mineral(2003) e Facas da manhã (1997). Suas poesias já foram publicadas na revista Poesia Sempre da Biblioteca Nacional, nos jornais Poesia Viva, Panorama da Palavra e Rio Letras. Leia um poema de Cristal rutilado: 
CORDÃO UMBILICAL 
Em tudo há mãe
o cerne o começo.
Da minha tenho quase tudo
o sorriso, a face, a vulva
o que insiste e persiste
no dia seguinte
e em mais outro dia
o que a esse se soma
a vontade de mais outro dia.
E como um novelo
desenrolo os dias
até nela chegar. 




Por Rodrigo Canuto 

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Literatura e Drogas

Foto: Paula Kossatz

Arte, literatura, ambição, drogas, loucura. Esta é a mistura da peça O bom canário, em cartaz no Rio de Janeiro, no Teatro Poeira, em Botafogo. Escrita pelo norte-americano Zacharias Helm, que possui longa carreira como roteirista de cinema, a trama do espetáculo nos apresenta o casal Annie (Flávia Zillo) e Jack (Joelson Medeiros). Ela, dona de casa e viciada em anfetaminas; ele, escritor de um romance de sucesso. Há ainda os personagens do editor, o agente literário e o crítico literário.

Ambientada na Nova York invernal, O bom canário foi apresentada na França em 2007, sob direção de John Malkovich. Na época, a peça recebeu em Paris seis indicações para o Moliére e ganhou o Crystal Globe Award. Por aqui, recebeu críticas elogiosas de Barbara Heliodora e Lionel Fischer.

Rafaela Amado, uma das diretoras da montagem brasileira, afirma que "buscou valorizar o elenco e reforçar a história de cada personagem, trabalhando a fragmentação da vida comum, das relações, dos amores". A iluminação de Luiz Paulo Nenen e o cenário de Lipiani e Lídia Kosovski reforçam a sensação de fragmentação.

O bom canário fica em cartaz até dia 4 de março.






SERVIÇO

Teatro Poeira

Endereço: Rua São João Batista, 104 - Botafogo - Rio de Janeiro

Temporada: de 12 de janeiro a 12 de fevereiro e 23 de fevereiro a 04 de março

De quinta a sábado às 21h e domingo às 19h

Classificação etária: 16 anos

Valor do ingresso: R$ 50,00 (inteira) e R$ 25,00 (meia)

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

"Credito tudo à espiritualidade"

Foto: Vânia Laranjeira


Na quarta-feira passada, 26, driblei o sol e as construções e reformas do Centro do Rio para chegar à sede da Praça XV do Museu da Imagem e do Som (MIS). O motivo era mais do que nobre: o compositor, escritor e especialista afro-brasileiro, Nei Lopes participou do Depoimentos para a Posteridade. Foi o início das comemorações de seu aniversário de 70 anos, a ser comemorado dia 9 de maio.

Em quase quatro horas de entrevista, Nei falou de infância, de vida no subúrbio, de carreira (como advogado, artista e pesquisador), de literatura, e, claro, de muita, muita música. Avaliando seus percalços e suas conquistas, ele resume: "credito tudo à espiritualidade".

Vestido de vermelho em homenagem a Xangô, Nei contou sua infância no Irajá. A música se fazia presente no cotidiano graças a um irmão mais velho e à mãe, que cantava enquanto cuidava da casa e dos doze filhos. O caçula era apaixonado pelo carnaval. Quando passou a estudar na Escola Técnica Visconde de Mauá, o samba foi incorporado com mais força á rotina do garoto.

Nei alcançou certa fama quando em 1972, Alcione gravou duas músicas suas. Em 1975, Nei conheceu Wilson Moreira, que viria a ser seu principal parceiro nas composições. Clara Nunes gravou seis composições da dupla, entre elas a clássica Senhora Liberdade. Outros intérpretes das canções de Nei foram Alcione, Roberto Ribeiro, Elizeth Cardoso, Zeca Pagodinho, Dudu Nobre, entre outros.

Desde 1981, Nei também é escritor e pesquisador. Lançou 27 livros, entre poesia, romance, livros de história e obras de consulta. Em todos eles, a negritude, a história dos africanos, a cultura e a religião da África, mãe de todos nós. Seu último lançamento foi Essa árvore dourada que supomos (Babel) em novembro passado. Para 2012, serão lançados o Dicionário da hinterlândia(sobre as origens dos nomes dos bairros do subúrbio carioca) e o romance A Lua triste descamba. Seu Dicionário Banto ganhará reedição e o escritor ainda deixou no ar a promessa de um livro infantil.

O artista escolheu bem seus entrevistadores. Além da pesquisadora e vice-presidente do MIS Rachel Valença, estavam na mesa o escritor Alberto Mussa, o músico e compositor Claudio Jorge, o jornalista Fernando Molica e o historiador Joel Rufino. Todos compartilhavam com Nei uma história curiosa ou a paixão pela música popular.

Como advogado, Nei atuou por pouco tempo. Não gostava da carreira. Mas ela teve seu valor: quando questionado sobre a nostalgia como tema recorrente em suas canções, Nei se lembrou de como compôs Samba do Irajá. Certo dia, já saturado pelo trabalho, não acompanhou seus colegas para o almoço. Ficou no escritório e datilografou a canção. "Irajá é uma metáfora do meu pai saudoso", revelou. Na folha do original, ficou a marca de uma lágrima.

E aí, o momento mais emocionante do dia: Nei e todo o auditório cantaram juntos Samba do Irajá. Cláudio Jorge improvisou a percussão em um livro e Alberto Mussa tirou melodia da espiral de um calendário. Foi a conclusão perfeita para uma tarde recheada de revelações, história divertidas e espiritualidade. 


Por Rodrigo Canuto