terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Guilherme Fiuza, roteirista de O brado retumbante


(TV Globo/ João Cotta) 
Presidentes por acaso não são raros na história do Brasil. Na ficção, o personagem mais recente a ganhar o cargo é Paulo Ventura da série O brado retumbante. Interpretado por Domingos Montagner, Paulo é um popular deputado da oposição, que lidera uma caça aos políticos corruptos. É eleito presidente da Câmara, em uma manobra política de seus adversários para cooptá-lo. E o acaso faz o seu papel: o presidente da república e seu vice morrem em um acidente aéreo. Seguindo os deveres constitucionais, Paulo torna-se o presidente por 15 meses. Sabendo que não dispõe de tempo suficiente para empreender as reformas das quais o Brasil precisa, ele acentua a luta contra a corrupção.

Escrita por Euclydes Marinho com a colaboração de Guilherme Fiuza, Nelson Motta e Denise Bandeira, a série está em sua última — e emocionante — semana."Eu quis mostrar nesta minissérie que, por trás de todo presidente, existe um ser humano, alguém que tem problemas, dor de barriga, pai, mãe e mulher. E que nós não ficamos sabendo. Revelar essa intimidade um homem comum na Presidência. Na história do Paulo Ventura, ele já era um político que vivia uma fase desanimada como homem público, e que acaba sendo eleito presidente da Câmara dos Deputados por uma manobra, para ser um fantoche do sistema", revela Euclydes.

Os bastidores da política não são grande mistério para Guilherme Fiuza. Jornalista, e escritor (autor de Meu nome não é Johnny, entre outros), Fiuza foi editor de política do jornal O Globo e hoje mantém um blog no portal da revista Época.

O Brado Retumbante vai ao ar nas noites de terça à sexta na TV Globo. 



Por Rodrigo Canuto 

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Livros antigos em Buenos Aires




Estava chovendo e entramos correndo em uma livraria que, num primeiro olhar, parecia um sebo. Livros antigos, encadernações em couro, letras douradas... O lugar era grande. O vendedor conversava com um cliente e comecei a explorar sem pedir licença.

Fui dar em um salão largo nos fundos, as paredes cobertas de livros antigos, duas mesas de escritório; sobre uma delas, um busto de Julio Cortázar. E uma foto do escritor abraçando um senhor — provavelmente o dono da loja.

Percebi uma passagem oculta na lateral direita, fui olhar... Era um corredor escuro, forrado de livros de cima abaixo, entre a parede verdadeira e uma espécie de estante tão alta e firme que parecia outra parede. Deu um pouco de medo e parei. Era como se os espíritos dos autores daqueles livros me dissessem: "aqui só entra o dono desse lugar, nosso guardião".

De volta ao salão principal, fiquei sabendo que a livraria se chama Fernandez Blanco, que existe desde 1939 (a idade da minha mãe) e faz parte da Asociación de Libreros Anticuarios de La Argentina — ALADA, que congrega 42 livrarias especializadas no comércio de livros antigos e raros. Incrível! No Brasil, uma livraria como aquela não duraria um mês.

O jovem dono, Lucio Fernando Aquilanti — a segunda geração à frente do negócio — disse ser um apaixonado por Julio Cortázar, daí tantas fotos do escritor nascido na Bélgica de pais argentinos. Perguntei se conseguia viver do lucro da livraria e ele disse que sim, que o comércio de livros raros e antigos movimenta bastante dinheiro na Argentina e que o ponto alto do ano é a Feria Del Libro Antiguo de Buenos Aires, que acontece todo mês de novembro, onde somente livros com esse perfil são comercializados.

— Vem gente de toda Argentina para essa feira. Os livreiros expõem as últimas raridades garimpadas: primeiras edições autografadas, revistas literárias esgotadas, coleções reunidas. As encadernações devem ser originais e em bom estado — contou-nos Lucio.

Ficamos quase uma hora conversando e chegou o momento de partir, a chuva havia parado. Mas ainda posso sentir o cheiro do lugar, dos livros raros e antigos, e ouvir o sussurro dos escritores que habitam o corredor escuro, atrás da parede falsa. 

Por Valéria Martins 

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Letras e/& artes ganha edição fac-similar 50 anos após sua descontinuação


50 anos após ter sua publicação interrompida, a polêmica página literária letras e/& artes ganha uma edição fac-similar comemorativa. Publicada aos domingos no jornal Diário do Paraná entre 1959 e 1961, o suplemento é resgatado em uma edição organizada pelo o cineasta, poeta e escritor Sylvio Black, editor original das 85 edições de letras e/& artes. “Inexplicavelmente, às vezes a logomarca saía com ‘e’, outras, com ‘&’’’, explica Sylvio o motivo da grafia atual do nome do caderno.


Nas páginas do letras e/& artes, compareciam com regularidade Mario de Andrade, Celina Silveira Luz, Roberto Muggiati, Adherbal Fortes de Sá Jr., Walmir Ayala, Jairo Régis, entre vários outros, contribuindo com ensaios, críticas, poemas e ilustrações. Seu conteúdo refletia as discussões em voga na época: cultura popular, existencialismo, marxismo, arte engajada, a relevância da poesia, da literatura, do teatro e do cinema brasileiros. As opiniões dos contribuidores muitas vezes despertava polêmicas da “micro-intelectualidade curitibana”, como define Sylvio, mas os leitores remetiam cartas e telefonemas elogiosos, dando fôlego à publicação.


A nova edição, com tiragem de 500 exemplares, não será comercializada. Terá distribuição nacional para bibliotecas, universidades e academias literárias. A nova letras e/& artes conta com financiamento da Itaipu Binancional, com o apoio da Secretaria de Estado da Cultura do Paraná, através do projeto gráfico e editoração de Rita de Cássia Solieri Brandt e de Adriana Salmazo Zavadniak, e da seção paranaense da Biblioteca Pública do Paraná, onde está arquivada a coleção original do jornal.


Sylvio tinha apenas 22 anos quando iniciou a publicação do suplemento. “Para dar conta dessa inédita empreitada, tínhamos total liberdade de expressão e opinião. Jamais a editoria foi admoestada ou censurada, nem constrangida a publicar texto não solicitado”, afirma. 




por Rodrigo Canuto

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Sísifo desce a montanha, de Affonso Romano de Sant'Anna


Se para algumas pessoas temas como angústia, morte, Deus ou limitações humanas são soturnos, para Affonso Romano de Sant'Anna essas são reflexões cotidianas. Seu novo livro de poesia Sísifo desce a montanha (Rocco) continua seu projeto poético, aprofundando questões de obras anteriores. Diretor da Biblioteca Nacional entre 1990 e 1996, criador do Sistema Nacional de Bibliotecase do PROLER (Programa de Promoção da Leitura), logo na epígrafe, Affonso evoca Clarice Lispector para avisar que Sísifo... é também um exercício de "deseroização" de si mesmo. Leia abaixo entrevista com o autor. 


Quanto tempo levou escrevendo e reunindo as poesias que compõem Sísifo desce a montanha? Os poemas abarcam qual período da sua vida?
Esses poemas foram escritos durante a vida toda. Cada poema foi escrito antes dele mesmo. Mas os exprimi, purguei, escrevi nos últimos anos. 


Como você escreve poesia? Anda com um caderno de anotações sempre à mão ou senta e escreve?
Ou ela me atropela ou eu a invoco. Caderninho ou qualquer papel urgente para anotar. Um dos segredos é estar atento ao que a gente sopra para a gente mesmo. E selecionar. Ou esperar amadurecer. 


Costuma retrabalhar muito os versos ou respeita a forma espontânea com que se manifestam?
Há poemas que levaram seis anos de trabalho explícito. Uns podem ser espontâneos, mas outros, por exemplo, os escritos durante a ditadura, contra a situação, eram sentidos por um lado e planejados por outro. 


Você já teve alguma crise de criatividade? Como aconteceu o desbloqueio?
A crise é normal.Várias vezes tive a certeza de que jamais escreveria poesia de novo. Quanto ao ensaio e à crônica, não pode haver bloqueio, é o escritor profissional que atua dentro e ao lado do outro instintivo. 


O programa de incentivo à tradução de escritores brasileiros no exterior, criado por você quando era presidente da Biblioteca Nacional, foi retomado. O que acha que pode acontecer nesse novo momento?
Ainda bem que foi ampliado e retomado. Há 20 anos foi um esforço de exportação de nossa cultura. Fizemos reuniões com agentes literários estrangeiros aqui, com diretores de suplementos literários estrangeiros, feiras internacionais, clipping de notícias para os brazilianistas (não havia internet) e oBrazilian Book Magazine, etc. Mas falta muita coisa. Acho que hoje deveria ter um projeto pra financiar não só os tradutores, mas até as editoras estrangeiras. Não dá para esperar mais 500 anos pra ver o Brasil acontecer. 


Você é um dos maiores divulgadores e batalhadores do incentivo à leitura, é o criador do PROLER. Como se leva uma pessoa adulta a gostar de ler? E uma criança?
Todo mundo tem direito à leitura, há técnicas diversas para isto. Há programas para babytecas, crianças no maternal e para adultos em asilos. A todo momento sei de histórias de operários, pescadores, aposentados que redescobrem a leitura. Dizer que só se aprende a gostar de ler na infância é papo de quem nunca trabalhou na área. 


Quais são seus planos agora?
Ihh! Bota plano nisto. O enigma vazio vai sair em italiano e a tradução para o francês está pronta. Desconstruir Duchamp está em alemão aguardando o editor.Barroco do quadrado à elipse já está em espanhol traduzido pelo Manolo Graña que traduziu também A grande rala do índio guarani. Para 2012 um novo livro de crônicas pela L&PMComo andar no labirinto, reedição de Análise estrutural de romances brasileirosMúsica popular e moderna poesia brasileira e talvez eu faça o terceiro volume de Poesias Reunidas (L&PM). Ah, sim, vou editar meus textos e os de Marina sobre Clarice Lispector, acompanhados da entrevista que fizemos com ela no MIS (Museu da Imagem e do Som) em 1977. E quem sabe o audiolivro com contos dela — Laços de família — que gravei sai em 2012?



Por Rodrigo Canuto e Valéria Martins 

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

A Ilha, de Flávio Carneiro


“Confiar em romances é como confiar nas ondas do mar”, sentencia o bibliotecário franciscano que narra Ilha, novo livro de Flávio Carneiro. Em um futuro indeterminado, após uma catástrofe ambiental, todos os continentes são cobertos por água, sobrando apenas uma ilha. A rotina da ilha paradisíaca é afetada pela chegada de mapas dentro de garrafas sugerindo a existência de um continente não muito longe dali. Ao mesmo tempo, locais vão desaparecendo: o cais, o mercado, ruas. Nada é o que parece nesse romance em que as fronteiras entre o real e o imaginário se esvanecem.
Ilha é o terceiro romance da Trilogia do Rio de Janeiro, na qual Flávio Carneiro dialoga com diferentes gêneros literários: depois do passeio pelo policial em O Campeonato e o flerte com o fantástico em A Confissão, chega a vez da ficção científica em Ilha. Leia abaixo entrevista com o autor.


Por que um livro de ficção científica?
Este é o terceiro romance do que chamei de Trilogia do Rio de Janeiro. São romances com histórias independentes mas que têm em comum o Rio como cenário. Busquei, em cada um deles, fazer um diálogo com um gênero popular. O primeiro, O Campeonato, é um policial. O segundo, A Confissão, caminha pelo fantástico. E agora, em Ilha, optei pela ficção científica, ambientando a história num Rio do futuro e homenageando assim não apenas a cidade mas um gênero de que gosto muito.


A história de "A ilha" é mirabolante. De onde surgiu o enredo?
Eu dirigia pela estrada, indo de Teresópolis para o Rio, e quando já estava no Rio e avistei as montanhas, o Pão de Acúcar, pensei: e se um dia quase tudo isso que estou vendo fosse água? Se sobrassem apenas as montanhas, se o resto da cidade fosse parar sob as águas? Foi daí que veio a ideia.


Estão na moda filmes que buscam "quebrar" ou, no mínimo, instigar a nossa lógica - assim como "A ilha": "A origem", "Sem limites". Você assistiu? Gosta desse gênero de filmes? Quais são seus filmes favoritos de ficção científica?
Gosto sim. Sempre busco nos meus romances criar uma lógica particular, interna, que coloque em xeque a ordem que temos como normal. Gosto de alguns filmes de ficção científica, como os que você citou, mas o meu preferido, disparado, é Blade Runner, do Ridley Scott.


Você mora fora do Rio de Janeiro. Em que isso ajuda e/ou atrapalha ser escritor nos dias de hoje?
Não atrapalha porque estou sempre perto do Rio, no caso de precisar dar uma entrevista em rádio e TV ou participar de algum evento literário. E ajuda porque em Teresópolis tenho mais sossego, mais silêncio pra escrever.


Quais são seus próximos planos?
Não sei ainda. O mais provável é que retome o gênero policial.