sexta-feira, 19 de outubro de 2012

O incrível geneticista de Angela Dutra de Menezes


Em O incrível geneticista chinês (Ed. Record, 2012), seu oitavo romance, Angela Dutra de Menezes narra com ironia e bom humor – pela voz do chinês Zhang – as peripécias de um cientista em suas pesquisas cromossômicas atrás da cura da obesidade e da chatice. "Não há jeito de sobreviver a alguma coisa que nos maltrata sem ser pelo viés do humor", diz. Traduzida para Portugal e Espanha, Angela – que faz do cotidiano matéria-prima para seus livros – fala nesta entrevista sobre seus personagens, seus incômodos e inspirações.

Em quem você se inspirou para criar o Dr. Wang? E sua 'cobaia', o chinês Zhang Cheng?
Em mim mesma, em muitas pessoas à minha volta. Principalmente naquelas que me incomodam por não terem a menor noção de limites. A verdade é que, de um jeito ou de outro, todos temos as nossas chatices. E nenhuma paciência para suportar as alheias. Este livro e sua personagem principal, o Dr. Wang, nasceram da mesma maneira que os outros sete livros que já tenho publicados: observando o cotidiano.

O que a motivou a tratar – de forma crítica e ao mesmo tempo humorada – destas duas questões, a chatice e a obesidade?
Ambas me incomodam muitíssimo, sofro de ambas. Não há jeito de sobreviver a alguma coisa que nos maltrata sem ser pelo viés do humor. Se tenho alguma qualidade – acho que tenho e é a única – é o senso de humor. Aproveito-me dele. Minhas abordagens sempre são pelo lado mais ridículo. Nem todos entendem, o que posso fazer? Eu sou assim.

Quais foram suas fontes de pesquisa para sustentar o conhecimento dos seus personagens?
Fontes biológicas, nenhuma. Pesquei, aleatoriamente, termos na Internet. Para escrever um livro assim, ou conheceria biologia a fundo, o que não é o caso, ou deixaria claro que nada sei sobre o assunto. Fiz esta opção. Já não tenho tempo útil para aprender biologia.

O que O incrível geneticista chinês traz de novo em relação aos seus romances anteriores?
A ambientação e a nacionalidade das personagens. Não sei por qual motivo, elas nasceram chinesas e emigraram para Los Angeles, Estados Unidos. Este é o primeiro livro que sai completamente da minha cultura. Eu mesma achei estranho.

Já está planejando algum novo livro?
Não, estou parada, esperando para ver o que acontece. Literatura é apaixonante, mas, também, delicada. Agora, quero observar tudo muito bem. Depois, decidirei o que fazer.

Teatro e rock encenam conto de Marcelo Mirisola


Baseada no conto de Marcelo Mirisola, a peça Sobre os ombros dourados da felicidade (Punk Modo On) já está em cartaz no Rio de Janeiro. O novo espetáculo da Anti Cia de Teatro – concebido a partir da leitura de Mate-me, por favor, que narra a trajetória do movimento punk – leva aos palcos de teatro um show de rock.

Com a presença da banda Os Dissidentes, dois atores – Bruno Aragão e Janaína Russeff – narram ao microfone a história de um casal que vê seu futuro ameaçado por um cisto que surge no ombro da mulher. "A ideia inicial do projeto era desenvolver uma dramaturgia própria, mas quando reli o conto do Mirisola concluí o óbvio: bem mais punk e bem melhor do que qualquer dramaturgia que a gente venha a criar", disse o diretor Fernando Maatz, que sempre admirou o trabalho do escritor.

A peça é apresentada no Reserva+, todas as segundas até o dia 29 de outubro, sempre às 20h30. A entrada é gratuita.

SERVIÇO
Onde: Reserva+ (Av. Fransisco Otaviano, 67)
Quando: 01 à 29 de outubro. Segundas, às 20h30
Realização: Anti Cia de Teatro e CF Sócios
Título: Sobre os ombros dourados da felicidade (Punk Modo On)
Duração: 50 min
Faixa etária recomendada: 16 anos
Direção e Concepção: Fernando Maatz
Texto: Marcelo Mirisola

Elenco: Bruno Aragão e Janaína Russeff
Banda Os Dissidentes: Fernando Machado, Roberto Souza e Rodrigo Rua
Direção Musical: Roberto Souza
Vídeos e Concepção Visual: Renato Marques
Iluminação: Aramis David Correa
Fotos/Divulgação: Renato Marques


domingo, 7 de outubro de 2012

"O bruxo do Contestado" em nova edição


O escritor catarinense Godofredo De Oliveira Neto acaba de relançar, pela Ed. Record, seu romance O bruxo do Contestado, às vésperas do centenário do conflito armado que aconteceu na fronteira entre o Paraná e Santa Catarina. Publicada originalmente em 1996, a obra – de envergadura nacional, segundo Antonio Houaiss – foi estudada em várias instituições do país, como a Academia Militar de Agulhas Negras, universidades e escolas do ensino médio. Nesta entrevista, Godofredo fala sobre a nova edição, seu processo de pesquisa e o diálogo que estabelece entre realidade e ficção.

O bruxo do Contestado (Record, 2012) – que acaba de ser relançado, 100 anos após o conflito – foi publicado originalmente em 1996. O que o leitor pode esperar desta nova edição?
Todas as informações sobre o Contestado foram checadas e rechecadas. Os detalhes mais importantes da guerra vêm narrados aos poucos no decorrer do texto pela escritora Tecla. Uma narradora que escreve do exterior do acontecimento, buscando assim maior objetividade. No capítulo XV ela resume toda a Guerra do Contestado e a compara com a II Guerra Mundial e os fatos políticos de 1964 no Brasil. O Contestado persiste, assim, até os dias de hoje. Alguns trechos que escaparam na primeira versão foram incorporados nesta edição, alguns dados aperfeiçoados.

Embora tenha deixado cerca de 15 mil mortos, esse conflito civil na região do Contestado, fronteira entre o Paraná e Santa Catarina, não é muito divulgado. Por que essa tendência, na sua opinião? O que motivou você a resgatá-lo?
Penso que o conflito foi o maior acontecimento social organizado no Brasil do século XX, o maior conflito fundiário brasileiro daquele século. Empregaram-se aviões com fins militares pela primeira vez no continente, foram testadas armas que seriam usadas na I Guerra Mundial. As primeiras greves organizadas se deram ali. O Contestado está entre os grandes embates ideológicos no ocidente no século XX, temia-se o surgimento de um país independente socialista na região. Segundo depoimentos e informações que colhi, representantes de tendências ideológicas mundiais estiveram presentes, do Secretariado americano, do Partido dos Trabalhadores Russos, do Partido trabalhista Inglês, da Confederação do operariado argentino e por aí afora. No entanto, a guerra do Contestado tinha começado apenas super-regionalmente. Mas era fronteira com a Argentina, então Buenos Aires ficou de prontidão. Houve também uma enorme tensão racial entre colonos alemães e italianos, chamados para colonizar a terra habitada por moradores há décadas e décadas, e o Brasil cafuzo. O litoral e o sertão de novo em choque, como em Canudos. Só que agora havia ainda a presença de sete mil trabalhadores vindos do Recife e do Rio para construir a estrada de ferro, e que acabaram largados por lá, e que, claro, se juntaram aos revoltosos. O Rio político ficou em polvorosa. O STF foi acionado, Ruy Barbosa foi o advogado do Paraná, Epitácio Pessoa de Santa Catarina. A jovenzinha República se assustou, os revoltosos eram monarquistas. O Governo Central estava perdendo a parada. Enfim, uma confusão dos diabos que, para a sorte do governo do Rio, a eclosão da I Grande Guerra empurrou o conflito para debaixo do tapete. E assim se manteve por décadas.

Você investiu em algum tipo de pesquisa para escrevê-lo?
Compulsei todos os arquivos e obras sobre o tema. Me vali também livremente de dados fornecidos em rodas familiares (sou sobrinho do General Mesquita, que serviu em Canudos como soldado e foi depois enviado para o Contestado). A pesquisa levou anos. Um ponto importante e difícil é justamente cortar, caso contrário daria duas mil páginas! Inviável em todos os aspectos.

Apesar de inspirado num conflito real, O bruxo do Contestado é um livro de ficção. O que é realidade e o que é ficção na sua história?
É, como chamam os especialistas, um romance de extração histórica, não é um ensaio de história nem um romance histórico. Há, por ser justamente uma ficção, alguma licença poética, como Euclides fez no seu Os Sertões, aliás. Me considero romancista antes de tudo. Mas construo um diálogo entre verdades históricas, com trechos de jornal da época, com situações literárias. Os historiadores estarão em melhor situação do que eu para estabelecer a "verdade verdadeira". Mas dados para serem interpretados estão nas folhas do Bruxo.

Existe a expectativa de que um outro romance seu, Amores exilados (Record, 2011), seja adaptado para o cinema. O que essa possibilidade representa para sua obra?
Tenho recebido muitos contatos de pessoas que querem escrever um roteiro a partir do livro. Estou estudando, o roteiro do Amores exilados ficou ótimo, queria que o do Bruxo também ficasse.