terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Livros antigos em Buenos Aires




Estava chovendo e entramos correndo em uma livraria que, num primeiro olhar, parecia um sebo. Livros antigos, encadernações em couro, letras douradas... O lugar era grande. O vendedor conversava com um cliente e comecei a explorar sem pedir licença.

Fui dar em um salão largo nos fundos, as paredes cobertas de livros antigos, duas mesas de escritório; sobre uma delas, um busto de Julio Cortázar. E uma foto do escritor abraçando um senhor — provavelmente o dono da loja.

Percebi uma passagem oculta na lateral direita, fui olhar... Era um corredor escuro, forrado de livros de cima abaixo, entre a parede verdadeira e uma espécie de estante tão alta e firme que parecia outra parede. Deu um pouco de medo e parei. Era como se os espíritos dos autores daqueles livros me dissessem: "aqui só entra o dono desse lugar, nosso guardião".

De volta ao salão principal, fiquei sabendo que a livraria se chama Fernandez Blanco, que existe desde 1939 (a idade da minha mãe) e faz parte da Asociación de Libreros Anticuarios de La Argentina — ALADA, que congrega 42 livrarias especializadas no comércio de livros antigos e raros. Incrível! No Brasil, uma livraria como aquela não duraria um mês.

O jovem dono, Lucio Fernando Aquilanti — a segunda geração à frente do negócio — disse ser um apaixonado por Julio Cortázar, daí tantas fotos do escritor nascido na Bélgica de pais argentinos. Perguntei se conseguia viver do lucro da livraria e ele disse que sim, que o comércio de livros raros e antigos movimenta bastante dinheiro na Argentina e que o ponto alto do ano é a Feria Del Libro Antiguo de Buenos Aires, que acontece todo mês de novembro, onde somente livros com esse perfil são comercializados.

— Vem gente de toda Argentina para essa feira. Os livreiros expõem as últimas raridades garimpadas: primeiras edições autografadas, revistas literárias esgotadas, coleções reunidas. As encadernações devem ser originais e em bom estado — contou-nos Lucio.

Ficamos quase uma hora conversando e chegou o momento de partir, a chuva havia parado. Mas ainda posso sentir o cheiro do lugar, dos livros raros e antigos, e ouvir o sussurro dos escritores que habitam o corredor escuro, atrás da parede falsa. 

Por Valéria Martins 

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